COLUNA-Oferta hidrelétrica e de renováveis no Brasil contribui para excedente global de gás
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(As opiniões expressas aqui são de responsabilidade do autor, analista de mercado da Reuters.)
Por John Kemp
LONDRES (Reuters) - As importações de gás do Brasil caíram em 2023 para o nível mais baixo das últimas duas décadas, já que a demanda de energia térmica foi afetada pela recuperação dos reservatórios das hidrelétricas cheios e pela rápida implantação de energia eólica e solar.
As importações foram as mais baixas desde 2003, mostraram dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), com 6,5 bilhões de metros cúbicos em 2023, contra 9 bilhões de metros cúbicos em 2022 e 16,9 bilhões de metros cúbicos em 2021.
Os volumes têm apresentado uma tendência de queda constante desde 2015, com exceção de um breve aumento em 2021, quando o Brasil recorreu à energia movida a gás para compensar a perda de energia hidrelétrica devido a uma grave seca.
O sistema elétrico do Brasil é muito dependente da energia hidrelétrica, que foi responsável por entre dois terços e três quartos da geração total nos últimos cinco anos.
Isso faz com que as térmicas movidas a gás e outros combustíveis desempenhem um papel de reserva, atendendo aos picos de cargas, cobrindo as variações sazonais nos fluxos dos rios e fornecendo apoio quando os baixos níveis de água restringem a produção hidrelétrica.
A maior parte do gás chega ao Brasil via gasoduto da vizinha Bolívia, mas as necessidades marginais têm sido atendidas por importações de gás natural liquefeito (GNL) dos EUA e de outros países da Bacia do Atlântico.
No segundo e terceiro trimestres de 2021, a seca no Brasil e o aumento das importações de GNL contribuíram para a alta dos preços do gás nos Estados Unidos e na Europa, mesmo antes da invasão da Ucrânia pela Rússia em 2022.
Mais recentemente, no entanto, a abundância de água nas principais represas hidrelétricas garantiu altos níveis de geração e reduziu drasticamente a necessidade de importação de GNL.
Isso aliviou a pressão sobre o fornecimento de gás na Bacia do Atlântico e contribuiu para o declínio progressivo dos preços do gás desde o final de 2022 e ao longo de 2023.
A geração de energia hidrelétrica se recuperou para 445 bilhões de quilowatts-hora (kWh) em 2023, de um mínimo de apenas 378 bilhões de kWh em 2021, de acordo com o Operador Nacional do Sistema Elétrico.
Como resultado, a geração a gás caiu de 69 bilhões de kWh para 19 bilhões de kWh no mesmo período, enquanto a geração de outros combustíveis fósseis caiu de 39 bilhões de kWh para 16 bilhões de kWh.
Os recursos hídricos permaneceram relativamente confortáveis, apesar da precipitação abaixo da média na maior parte do Brasil desde meados de 2023, como resultado do El Niño.
Os reservatórios do subsistema Sudeste-Centro-Oeste, a maior do Brasil, estavam armazenando água suficiente para gerar 92 bilhões de kWh no início de fevereiro.
Os recursos caíram em relação aos 115 bilhões de kWh de um ano atrás, mas ainda estavam 30 bilhões de kWh (+48% ou +1,28 desvios-padrão) acima da média sazonal anterior de dez anos.
EÓLICA E SOLAR
A implantação maciça de geração eólica e solar também reduziu a demanda por gás e outros combustíveis fósseis.
A geração eólica cresceu a uma taxa anual composta de 15% nos últimos cinco anos, atingindo 94 bilhões de kWh em 2023, contra 46 bilhões de kWh em 2018.
O crescimento da energia solar foi ainda mais espetacular, com uma média de 71% ao ano, atingindo 50 bilhões de kWh em 2023, de 3 bilhões de kWh em 2028.
Até agora, os geradores solares e eólicos atenderam principalmente ao crescimento da carga incremental, substituindo parte do carvão e outros combustíveis fósseis, e tiveram pouco impacto sobre o gás.
O aumento da geração eólica e solar (+95 bilhões de kWh) atendeu à maior parte do aumento da geração total (+106 bilhões de kWh) desde 2018.
Mas se a implantação de energia eólica e solar em larga escala continuar, ela começará a reduzir ainda mais a já baixa participação residual da geração a gás, diminuindo a conta de importação do Brasil e disponibilizando mais gás para os consumidores na Europa e na Ásia.
*John Kemp é analista de mercado da Reuters. As opiniões expressas são de sua autoria.
Escrito por Reuters
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