Congresso e governo investem em propostas para tirar 'pedra no sapato' da alta dos combustíveis
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Por Maria Carolina Marcello e Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - O Congresso Nacional e o Palácio do Planalto decidiram apostar em várias frentes no Parlamento, na expectativa de que ao menos uma delas vingue com o objetivo único de atacar a alta dos combustíveis, pedra no sapato do mundo político em um ano de eleições gerais, avaliaram fontes legislativas.
O impulso de resolver os elevados preços da gasolina, do diesel e do gás, que também têm pressionado a inflação, envolve ao menos quatro matérias legislativas --dois projetos e duas Propostas de Emenda à Constituição (PEC), ambas com significativo impacto econômico que, apesar de contarem com o apoio do Planalto, não contam com a simpatia do Ministério da Economia, deixado de lado da elaboração dos textos.
Dois projetos de lei, de tramitação mais ágil, já estão pautados no Senado, a princípio, para o dia 15 deste mês. Mas segundo duas fontes, estão em fase de 'engenharia' e negociação para a construção de textos viáveis que, uma vez em votação, sejam aprovados.
Sob a relatoria do líder da minoria no Senado, Jean Paul Prates (PT-RN), um dos projetos na mesa de discussão cria uma conta de compensação para as flutuações do preço dos combustíveis. O outro visa a tributação sobre os combustíveis, em especial o ICMS, sob a alçada dos Estados, e já foi aprovado pela Câmara dos Deputados.
Justamente por se encontrarem nessa fase de construção de consenso, disseram ambas as pessoas consultadas, as duas propostas não devem ser votadas no dia 15. Devem ficar para depois do Carnaval.
A não ser, segundo uma das fontes, que ocorra alguma alteração envolvendo os combustíveis, um novo aumento do insumo, por exemplo. 'Se o preço sobe mais, vão fazer qualquer negócio', avaliou, referindo-se ao humor do Congresso.
A fonte lembra que o fator eleitoral serve de pressão para os parlamentares viabilizarem uma saída. No Senado, um terço dos senadores está na mira em busca da reeleição e a Câmara será totalmente renovada.
O presidente Jair Bolsonaro, atualmente em desvantagem nas pesquisas eleitorais, deve buscar a reeleição.
OUTRAS APOSTAS
Em outras trincheiras abertas, a aposta foi depositada em duas PECs. Construída com o aval e a participação do Palácio do Planalto, uma das PECs prevê que os entes da Federação possam promover, nos anos de 2022 e 2023, a redução parcial ou total de alíquotas de tributos sob a sua alçada incidentes sobre combustíveis. A matéria foi apresentada por um aliado do governo, o deputado Christino Aureo (PP-RJ), e encontra-se em fase de coleta das 171 assinaturas necessárias.
De acordo com o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), a PEC cumprirá a tramitação exigida, mas de forma acelerada, se contar com o apoio da maioria dos deputados.
'Vamos agilizar', disse à Reuters.
Encurtar o caminho e levá-la direto a plenário, explicou o líder, só seria possível mediante amplo acordo e caso isso não ocorra, ela deverá ter sua admissibilidade analisada pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa e depois passar por uma comissão especial, em um prazo mínimo de 10 sessões, para então seguir ao plenário.
Apesar do apoio público e declarado até mesmo de Bolsonaro, a PEC não foi bem recebida pelo Ministério da Economia, que não participou da elaboração do texto, e estima uma perda anual de arrecadação de até 54 bilhões de reais para a União.
Outra PEC já lançada, mas dessa vez no Senado pelo senador Carlos Fávaro (PSD-MT), propõe, entre outros pontos, a concessão de auxílio diesel temporário a caminhoneiros autônomos e a ampliação do pagamento do Auxílio Gás para 100% do valor do botijão no lugar dos atuais 50%.
Proposta com o maior impacto fiscal e apelidada de 'PEC kamikaze', recebeu a assinatura de diversos senadores governistas, inclusive do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). A decisão de apoiá-la, afirma uma fonte, foi chancelada pelo Palácio do Planalto.
'Foi um jogo combinado', disse a fonte, ao fazer a ressalva que por ora não há uma proposta prioritária do governo, apesar da assinatura de Flávio Bolsonaro a essa PEC.
A intenção, de acordo com essa pessoa, é testar qual das propostas prospera no Congresso. Segundo a avaliação, por se tratar de um ano eleitoral, o alto preço do insumo virou uma 'pedra no sapato' para o projeto de reeleição de Bolsonaro, além de ter repercussão grande na economia e impactar outros preços.
A fonte disse ainda que, a despeito da reação da área econômica do governo, é preciso sinalizar que se está em busca de uma solução para o assunto. O objetivo é tentar chegar a uma solução 'menos pior' para as contas públicas.
Na mesma linha, uma outra fonte afirma que paira um 'senso de urgência' para resolver o assunto.
Barros, líder do governo na Câmara, no entanto, afirmou que o Executivo é contra a PEC kamikaze.
TIRO PELA CULATRA
Colocado de lado nas discussões do governo na discussão de medidas para aliviar preços de combustíveis, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse a interlocutores que as propostas apresentadas no Congresso são bombas fiscais e acionou auxiliares para atuarem no que chamou de 'prevenção de desastre', informaram duas fontes da pasta. Em uma estratégia de contenção de danos, ele tenta convencer o governo a apoiar uma ideia com impacto menor para as contas públicas.
O ministro insiste que o melhor caminho seria a aprovação do projeto de lei que muda a forma de cobrança do ICMS sobre combustíveis, estabelecendo valor fixo para o tributo estadual, aquele sob a relatoria de Prates no Senado.
Diante da pressão dentro e fora do governo para o corte de tributos federais, Guedes diz aceitar a medida, desde que seja apenas sobre o diesel, medida com impacto anual de aproximadamente 18 bilhões de reais.
Segundo esses dois membros da pasta, o ministro argumenta que o corte de imposto para controlar preços pode resultar em efeito contrário, com desvalorização do real (o que encarece os combustíveis), e impacto sobre juros e inflação. Nesta terça, o Banco Central apresentou avaliação na mesma linha ao divulgar a ata do Comitê de Política Monetária (Copom).
(Reportagem adicional de Bernardo Caram e Rodrigo Viga Gaier)
Escrito por Reuters
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