Trump sugere adiar eleição dos EUA; republicanos no Congresso rejeitam
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Por Steve Holland
WASHINGTON (Reuters) - O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, levantou nesta quinta-feira a possibilidade de adiamento da eleição presidencial de 3 de novembro, uma ideia rejeitada imediatamente tanto por democratas quanto por republicanos no Congresso --a única instância com autoridade para fazer tal alteração.
Críticos e até aliados de Trump refutaram a ideia, que não levaram a sério, e alguns disseram ser apenas uma tentativa de desviar a atenção diante de notícias econômicas devastadoras.
O comentário de Trump no Twitter veio no momento em que os EUA atravessam uma das maiores crises de uma geração: uma pandemia de coronavírus que já cobrou mais de 150 mil vidas, uma recessão paralisante provocada pelo surto e protestos de âmbito nacional contra a violência policial e o racismo.
Na manhã desta quinta-feira, o governo dos EUA anunciou a pior contração econômica desde a Grande Depressão: queda de 32,9% no segundo trimestre.
Trump, que pesquisas de opinião mostram atrás e perdendo terreno para o adversário democrata e ex-vice-presidente Joe Biden, também disse que não confiaria nos resultados de uma eleição que incluísse uma votação pelo correio em larga escala --uma medida que muitos observadores consideram essencial por causa da pandemia de coronavírus.
Sem provas apresentar, Trump repetiu alegações de fraude nas votações pelo correio.
'Com uma votação universal pelo correio (não votação fora do domicílio, que é boa), 2020 será a eleição mais IMPRECISA E FRAUDULENTA da história. Será um grande constrangimento para os EUA', tuitou Trump. 'Adiar a votação até as pessoas poderem votar de forma apropriada, garantida e segura???'
Os Estados Unidos realizaram eleições ao longo de 200 anos, inclusive durante a Guerra Civil, a Grande Depressão e duas guerras mundiais. O Artigo 2 da Constituição dá ao Congresso o poder de programar as eleições, e a 20ª emenda encerra o mandato do presidente e do vice-presidente no dia 20 de janeiro seguinte à eleição geral.
Diversos parlamentares republicanos --entre eles o líder da maioria no Senado, Mitch McConnell, e o republicano mais graduado da Câmara dos Deputados, Kevin McCarthy-- rejeitaram a ideia.
'Nunca na história das eleições federais deixamos de realizar uma eleição, e deveríamos ir adiante com nossa eleição', disse McCarthy.
O senador Lindsey Graham, um aliado de Trump, disse: 'Adiar a eleição provavelmente não seria uma boa ideia.'
O deputado democrata Zoe Lofgren, que preside o comitê da Câmara que supervisiona a segurança das eleições, rejeitou qualquer adiamento.
'Sob nenhuma circunstância, consideraremos fazê-lo para acomodar a resposta inepta e aleatória do presidente à pandemia de coronavírus ou dar credibilidade às mentiras e desinformação que ele espalha', disse Lofgren em um email à Reuters.
Trump escreveu no Twitter também nesta quinta-feira que os norte-americanos precisam conhecer os resultados das eleições na noite da votação, não dias ou meses depois. Às vezes, as cédulas por correio podem levar mais tempo para serem contadas.
'Fico feliz por ter conseguido que a LameStream Media (referência pejorativa à mídia tradicional), muito desonesta, finalmente começasse a falar sobre os RISCOS à nossa democracia com a perigosa votação universal pelo correio', disse no Twitter.
Os tuítes de Trump aprofundarão os temores dos democratas de que ele tentará interferir nas eleições ou se recusará a aceitar o resultado, caso perca. Biden tem dito que esse é seu maior medo e chegou ao ponto de sugerir o envio de militares para forçar Trump a deixar o cargo se ele se recusar.
Os democratas estão se preparando para possíveis recontagens de votos e a possibilidade de os apoiadores republicanos de Trump tentarem intimidar os eleitores nas urnas.
A parte realmente perigosa do tuíte de Trump na quinta-feira não foi sua sugestão de adiar a eleição --que é uma 'fantasia'--, mas sua mais recente alegação de que a votação pelo correio está repleta de fraudes, de acordo com Justin Levitt, professor da Universidade Loyola Marymount e um especialista em direito constitucional.
'Este é mais um exemplo do presidente buscando deslegitimar o processo eleitoral antes que aconteça', disse Levitt. 'Isso é profundamente desestabilizador.'
O tuíte de Trump surpreendeu alguns funcionários da Casa Branca. A Casa Branca, por sua vez, encaminhou perguntas sobre o tuíte à campanha de reeleição de Trump.
'O presidente está apenas levantando uma questão sobre o caos que os democratas criaram com sua insistência sobre a votação universal pelo correio', disse Hogan Gidley, secretário de imprensa da campanha. 'A votação universal por correio convida ao caos e a atrasos graves nos resultados.'
Mas Ari Fleischer, que foi porta-voz da Casa Branca no governo do presidente republicano George W. Bush, disse que Trump deveria apagar o tuíte.
'Esta é uma ideia que ninguém, especialmente o presidente dos Estados Unidos, deveria cogitar. Nossa democracia se baseia em eleições nas quais todos conhecem as regras e elas se aplicam a todos', disse Fleischer. 'Senhor presidente, por favor, nem finja brincar com isso. É uma ideia nociva.'
Um representante da campanha de Biden considerou o tuíte de Trump uma manobra óbvia para distração dos terríveis números do PIB divulgados nesta quinta.
'Vamos ficar de olho', disse.
O deputado democrata Dan Kildee tuitou que 'um presidente em exercício está vendendo mentiras e sugerindo adiar a eleição para se manter no poder'.
'Não deixem que isso aconteça. Todo americano --republicano, independente e democrata-- deve se manifestar contra a ilegalidade deste presidente em total desrespeito à Constituição'.
(Reportagem adicional de Rick Cowan, David Morgan, Patricia Zengerle, Susan Heavey, Michael Martina e Joseph Ax)
Escrito por Reuters
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