Acusações fatiadas podem viabilizar julgamento de Bolsonaro antes das eleições de 2026
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Por Manuela Andreoni e Luciana Magalhaes
(Reuters) - A opção da Procuradoria-Geral da República de apresentar denúncias fatiadas ao acusar o ex-presidente Jair Bolsonaro por suposta conspiração para anular sua derrota eleitoral de 2022 pode aumentar as chances de uma decisão final sobre o caso antes das eleições do ano que vem.
O procurador-geral Paulo Gonet dividiu os 34 acusados de tentativa de golpe em cinco peças criminais diferentes 'como forma de otimizar o andamento processual', segundo ele escreveu em processo judicial. A denúncia contra Bolsonaro envolve apenas ele e mais sete acusados, o que pode acelerar os procedimentos.
Isso pode significar que um julgamento dramático e televisionado no Supremo Tribunal Federal (STF) comece em meados do ano e potencialmente termine em dezembro, disse uma pessoa com conhecimento dos planos da corte. Uma condenação aumentaria os obstáculos que mantêm Bolsonaro fora da eleição presidencial de outubro de 2026.
Os promotores não discutiram publicamente as consequências eleitorais do caso, mas ressaltaram a suposta ameaça à democracia brasileira na última eleição.
Ainda assim, decidir sobre o caso de Bolsonaro antes do final do ano exigirá uma rapidez extraordinária do Supremo Tribunal Federal (STF). O julgamento do mensalão, que envolveu dezenas de políticos há mais de uma década, levou seis anos desde o momento em que as acusações foram apresentadas até uma decisão final.
Embora não seja impossível, 'não se pode garantir quando o processo será finalizado', disse o ex-ministro do STF Marco Aurélio Mello. 'O importante é que não se atropelem as normas e que o direito de defesa seja preservado.'
Os cinco juízes que compõem a Primeira Turma do tribunal -- Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Carmem Lúcia, Flávio Dino e Cristiano Zanin -- devem decidir já em abril se aceitarão a denúncia, acrescentou a mesma fonte.
Mas juristas continuam céticos sobre um veredito este ano.
Raquel Scalcon, professora de direito penal na faculdade de direito da FGV em São Paulo, disse que os ministros estarão sob pressão para conduzir o processo no ritmo correto.
Uma percepção de que estão acelerando os procedimentos para influenciar a eleição de 2026 pode levantar dúvidas sobre sua imparcialidade, disse ela, mas dada a importância do caso, o tribunal também receberá críticas se agir muito lentamente.
Um estudo de 2017 da faculdade de direito da FGV mostra que, em média, o tribunal levou quase quatro anos para concluir casos envolvendo pessoas com foro privilegiado, após ter aceitado as acusações.
No entanto, decisões recentes, como a condenação de apoiadores de Bolsonaro que vandalizaram prédios do governo após a eleição de 2022, mostram que o tribunal é capaz de agir rapidamente quando motivado, disse Ivar Hartmann, professor de direito do Insper em São Paulo.
'Isso poderia neste caso aqui resultar em um recebimento da denúncia em dois meses, a abertura da ação penal e o julgamento do mérito da ação penal até o fim do ano', disse.
Ainda assim, os advogados de defesa podem tentar prorrogar o julgamento o máximo possível para que os procedimentos se estendam até a corrida presidencial de 2026, alimentando a pressão política em jogo.
Os representantes de Bolsonaro, que têm negado que ele tenha apoiado o suposto golpe, não comentaram o assunto imediatamente. Mas seu advogado Celso Vilardi disse à GloboNews nesta quinta-feira que, com base nos primeiros sinais do STF, 'parece que querem fazer algo bastante rápido'.
ADICIONANDO OBSTÁCULOS
O ex-presidente enfrenta cinco acusações criminais, incluindo participação em uma organização criminosa armada e tentativa de derrubada violenta de instituições democráticas.
Embora as sentenças máximas combinadas para esses crimes possam exceder 40 anos, Rogério Taffarello, advogado e sócio do escritório de advocacia Mattos Filho, de São Paulo, disse que qualquer condenação provavelmente envolveria sentenças intermediárias, totalizando de 20 a 30 anos.
A denúncia no STF é apenas uma das barreiras ao objetivo de Bolsonaro de concorrer à Presidência no ano que vem.
Em 2023, o Tribunal Eleitoral Federal (TSE) proibiu Bolsonaro de exercer cargos públicos até 2030 por abuso de poder político em duas situações diferentes durante sua campanha presidencial de 2022. Seus aliados agora estão propondo mudanças nas leis que poderiam, por exemplo, reduzir o tempo que um político pode ser impedido de concorrer a um cargo.
Uma condenação do STF acrescentaria uma barreira constitucional aos objetivos eleitorais de Bolsonaro, e mudar esse texto é um desafio legislativo muito mais difícil. A Constituição do Brasil proíbe condenados que cumprem pena criminal de concorrer a cargos públicos.
Os promotores também devem apresentar duas novas denúncias contra Bolsonaro nos próximos meses.
No ano passado, a Polícia Federal acusou formalmente Bolsonaro de fraudar registros de vacinação para mostrar falsamente que ele estava imunizado contra a Covid-19. Meses depois, no mesmo ano, a polícia também acusou Bolsonaro de desviar joias que ele recebeu em 2021, enquanto era presidente.
Escrito por Reuters